Aspirações à vida eterna

jun/24

POESIA STICA

Aspirações à Vida Eterna

Santa Tereza D’Ávila

Vivo sem em mim viver

E tão alta vida espero,

Que morro de não morrer.

Vivo já fora de mim

Desde que morro de amor;

Porque vivo no Senhor,

Que me escolheu para Si.

Quando o coração lhe dei,

com terno amor lhe gravei:

Que morro de não morrer.

Esta divina prisão,

do amor em que eu vivo,

fez a Deus ser meu cativo,

e livre meu coração;

e causa em mim tal paixão

ser eu de Deus a prisão,

Que morro de não morrer.

Ai que longa é esta vida!

Que duros estes desterros!

Este cárcere, estes ferros

onde a alma está metida!

Só de esperar a saída

me causa dor tão sentida,

Que morro de não morrer..

Ai! Como a existência é amarga

Sem o gozo do Senhor!

Se é doce o divino amor,

Não o é a espera tão larga:

Tire-me Deus esta carga

Tão pesada de sofrer,

Que morro de não morrer.

Só vivo pela confiança

De que um dia hei de morrer;

morrendo, o eterno viver

Tem por seguro a esperança.

Ó morte que a vida alcança,

Não tardes em me atender,

Que morro de não morrer.

Olha que o amor é bem forte!

Vida, não sejas molesta;

Vê, para ganhar-te resta

Só perder-te: - feliz sorte!

Venha já tão doce morte;

Venha sem mais se deter,

Que morro de não morrer.

Lá no céu, definitiva,

É que a vida é verdadeira;

Durante esta, passageira,

Não a goza a alma cativa.

Morte, não sejas esquiva;

Mata-me para eu viver,

Que morro de não morrer.

Vida, que posso eu dar

a meu Deus que vive em mim,

se não é perder-me enfim,

para melhor o gozar?

Morrendo, o quero alcançar,

pois nele está meu socorro,

Que morro de não morrer.

Se ausente de meu Deus ando,

Que vida há de ser a minha

Senão morte, mais mesquinha,

Que mais me vai torturando?

Tenho pena de mim, quando

Me vejo em tanto sofrer,

Que morro de não morrer.

Já de alívio não carece

O peixe em saindo da água,

Pois tem fim toda outra mágoa

Quando a morte se padece.

Pior que morrer parece

Meu lastimoso viver,

Que morro de não morrer.

Se me começo a aliviar

Ao ver-te no Sacramento,

Vem-me logo o sentimento

De não poder gozar.

Tudo aumenta o meu penar,

Por tão pouco assim te ver,

Que morro de não morrer.


Quando me alegro, Senhor,

Pela esperança em ver-te,

Penso que posso perder-te,

E se dobra a minha dor:

E vivo em tanto pavor,

Sem na espera esmorecer,

Que morro de não morrer.

Oh! Tira-me desta morte,

E dá-me, Deus meu, a vida;

Não me tenhas impedida

Por este laço tão forte.

Morro por ver-te, de sorte

Que sem ti não sei viver,

Que morro de não morrer.

Choro a minha morte já;

E lamento a minha vida,

Enquanto presa e detida

Por meus pecados está.

Ó meu Deus, quando será

Que eu possa mesmo dizer

Que morro de não morrer?

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